terça-feira, 17 de outubro de 2017

Carga Pesada




O dia? Segunda feira, pós emenda de um feriado de quinta.
O horário?  7 horas da manhã no primeiro dia útil em horário de verão.
Estava em uma semana já de tensão, gigante pela própria natureza, da sua ovulação.
Havia voltado de viagem as 19 horas da noite do dia anterior, após 7 horas de viagem.
Assim mesmo. Tudo sete.
O número cabalístico que assombrava seu esgotamento físico e mental.

Tinha saído de casa correndo, atrasada para o trabalho. Suas pálpebras estavam inchadas tanto pelo sono quanto pelo choro.
O motivo do sono? cansaço. Já o do choro, nem ela sabia. Era uma confusão na sua cabeça: depressão pós viagem, muitas horas na estrada, correria por estar atrasada, mau humor matinal, chorava até por não querer estar chorando. Era uma péssima companhia para si mesma naquela manhã nublada.

 O aplicativo do trânsito, indicava que chegaria em cima da hora. Desde que não houvesse nenhuma intercorrência no trajeto, algo como obras bloqueando uma faixa, caminhão do lixo ou pegar todos os faróis possíveis fechados, estava tudo bem.

Faltando em torno de 3 quilômetros para chegar ao trabalho, notava que no sentido contrário vinha um caminhão. Desses bem cumpridos. Longos mesmo. Enormes. Um tipo daqueles que para toda a rua caso queira manobrar ou dar ré.
(Talvez ele nem fosse tão grande assim, mas parecia nessa circunstância).

Aconteceu o temido fato: ele deu seta para entrar na mesma rua que ela teria que seguir também.
Ela pisou no acelerador e olhou para o painel, procurando um botão de turbo escondido. Porém realmente seu carro não possuía este recurso.
Fez de tudo para conseguir entrar na frente do bendito caminhão. Já havia xingado mentalmente até a mãe do motorista. Havia parado de chorar, tão concentrada que estava em entrar na rua antes que a lesma colossal de oito rodas o fizesse.

Em vão, lutou. Além de não conseguir passar a frente do caminhão, ficou ainda atrás de outro carro.
Os xingos mentais tomaram forma de expressão oral. Uns quatro palavrões bem articulados foram ditos dela pra ela mesma. Bateu a mão no volante, como quem dava um soco. Um soco na fuça daquele motorista!
Olhava o relógio e o aplicativo. Tinha certeza que agora, atrás de tamanha joça, perderia preciosos minutos para atravessar o que faltava da distância.

Voltou a chorar, a se questionar o porque tudo estava dando errado logo cedo. Tudo se complicava, estava difícil e errado. Só queria chegar ao trabalho a tempo. Devia ter saído mais cedo sim, mas a culpa era do horário de verão que havia devorado com gosto, uma hora do seu sono REM.
Enquanto xingava Deus e o mundo, e questionava a própria existência se debatendo em desgosto pela vida e rotina... o caminhão deu nova seta:
Saiu da frente dela.
Entrou em uma rua qualquer a direita.
Seguiu o caminho dele.
Liberou a passagem.
Na verdade, não deve ter ficado mais que 20 segundos na mesma avenida em que ela estava.

Ao ver o caminhão indo embora e a rua livre novamente, se deu conta do quanto  perdeu tempo.
Não o  tempo do horário em si. Ela chegaria  no trabalho em breve.

Perdeu tempo se enfurecendo com algo irreal.
Preveu obstáculos no caminho que na verdade não existiram.
Pensou coisas tão ruins do motorista e da mulher que o gerou, sendo que sequer chegaram a atrapalha-la. E que mesmo que assim tivessem feito, não mereciam tamanho descontrole.

Parou de chorar, atônita e chocada com si mesma. Havia achado impressionante a maneira como o problema havia se resolvido sozinho. Sem que ela precisasse fazer nada.
Ele simplesmente ficou o tempo que deveria ficar e se mandou.
A estrada novamente isenta de obstruções.
Só tinha que esperar segundos. Nada mais que isso.

Não chegou assobiando ao trabalho, mas estacionou o carro, pensando que a vida era engraçada assim mesmo: resolvida com o tempo...e às vezes trazia respostas e alívios muito antes do que imaginava.

Basta ter paciência, um pouco de calma. Um pouco de fé.
Cedo ou tarde, a gente ultrapassa obstáculos.
Nem sempre podemos impedir que eles cheguem.
Eles chegam e nos obrigam a reduzir a marcha.
"Ei vai com calma! Aprecie a paisagem. Relaxe."
E simplesmente se vão.
O que parecia ser um baita problema e atraso de vida, na verdade, nem chegaria para ficar.
Quanto stress à toa.
Quanta injustiça com o pobre motorista, quando ela é quem tinha que ter saído de casa mais cedo.
Enfim...

Eram poucas as opções:
Ou ela chorava por ter acontecido o aborrecimento ou aproveitava para aumentar o volume do rádio e curtia por mais tempo a música.
Havia escolhido errado.

Mas quem nunca?


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terça-feira, 29 de agosto de 2017

Debaixo de sete chaves....

Não era um dia promissor.
Era um domingo ao qual ela se sentia sozinha.
Seus pais haviam viajado, mas de certa forma, mesmo com eles por perto, sentia-se assim, pois o que a incomodava era justamente aquele estado de sentir -se só, ainda que rodeada de pessoas.

Tinha que levantar-se cedo para fazer duas coletas de exame de sangue.
Ao chegar no local, viu que só tinha levado uma guia.

- Bárbara sendo Bárbara! . Logo pensou, emburrada com si mesma.

Entretanto, não levou -se tão a sério. Já haviam tantos problema rondando sua cabeça que retomar o assunto do quanto era atrapalhada, só pioraria a situação. Fez apenas uma coleta e voltaria na próxima semana. Fazer o que?

Ao sair do laboratório, resolveu passar no lugar que frequentava, para fortalecer a si e a sua fé.
Chegando lá, deparou -se com o tema da palestra: "Lembra- te mais de ti mesmo."
Lá foi explicado que lembrar da gente, não é ser egoísta.
É lembrar das metas que você traçou para você. Metas de  conhecimento, metas de realizações, metas de aprendizado, metas de crescimento espiritual e refletir se o caminho que está percorrendo é seguro. Se o caminho escolhido é o caminho do amor,  ou se é um caminho por um desfiladeiro de infortúnios, traçados por você mesmo a partir de escolhas que causaram isso. Enfim: que andas semeando e o que esperas colher?

Ela saiu de lá melhor.
Um pouco menos solitária. Se sentindo acolhida e cuidada por Deus.

Porém, ao chegar em casa, abrir janela e encarar o dia maravilhoso que brilhava lá fora, algo ainda a incomodava. Encarou o sol e o céu azul e pensou:
"Que dia lindo para se ficar no sofá, vendo tv. Pena que é o que tenho para hoje!"

Acomodou-se e passou a zapear os canais, não encontrando nada em que sua atenção se detivesse.
Foi até a cozinha procurar almoço.
Não havia nada.

Pensou em seguida:
"Depois vejo isso. Nem estou com tanta fome assim... como qualquer besteira... que seja!"

Ao sentar no sofá novamente, pegou o celular.
Havia uma mensagem:

" Babi, o que está fazendo? Estamos indo almoçar no Embu, passo na sua casa em 15 minutos se quiser ir com a gente!"
Foi só o tempo de responder que iria!

Ela correu para o quarto, trocou de roupa... não se esqueceu de agradecer a Deus pelo convite, tão inesperado da Fernanda e do Leo.

Mais que um convite, tratou-se de um resgate de um naufrágio no sofá. De desperdício de tempo. Da sensação da solidão. Chegaram no Embu, conversaram, comeram, riram e mataram saudades.
Que dia gostoso afinal. Voltavam para casa em torno das 16:30. Assim que entraram no estacionamento, havia uma nova mensagem no celular dela.

"Babi, estou fazendo um churrasco em casa. Vem pra cá!"
e cinco minutos depois, a mensagem em seguida:
"Bá, vem!!!"

Após os amigos primeiros a deixarem em casa, Bárbara só entrou em casa para pegar a chave do carro e seguir em direção ao novo convite.
Que dia era aquele afinal?

Convites inesperados que faziam a se sentir bem e querida.
Foi para o churrasco, que foi delicioso e chegou em casa pra lá de nove horas da noite.
O dia havia enfim acabado.

A sensação de que Deus havia mexido seus pauzinhos para que ela tivesse um dia bom foi inevitável.
Anjos! Anjos chamados Amigos.
Quem os tem, tudo tem!
Gratidão definia.

Eles mudam sua vida. Eles modificam situações.
Eles querem sua presença.
E ela entendeu...quem a quer bem, está ali. Chama por ela. Busca por ela.
Faz ela se sentir amada e benquista.
Quer a presença e corre atrás.

Foi um dia para entender que o melhor da vida, é simples:
é amor. é leve. é presença. é valorização. é saudade. é estar ali, podendo estar em qualquer outro lugar. é escolha. é semeadura e é colheita. é Deus. falando com ela outra vez, definitivamente e sempre.

quarta-feira, 23 de agosto de 2017

Sobre trilhas e rumos

Após dois meses que havíamos nos conhecido, estávamos passando o final de semana na cidade de Gonçalves em Minas Gerais.

Torcíamos para que o domingo amanhecesse com um agradável dia de sol, após um sábado com chuva e muito frio. Para nossa sorte, Santa Clara clareou e São Domingos iluminou. Planejávamos fazer uma trilha neste dia, colocamos a mochila nas costas e fomos.

Assim que chegamos na porteira de entrada, apareceu um cachorro, pra lá de carente. Pulava na gente e ficava cercando. Nos seguiu do começo ao fim. Em alguns momentos parecia indicar o caminho, familiarizado que ele estava naquele território. 

Confesso que às vezes, até nos assustava, entrando por umas árvores e do nada saindo de um outro lado, correndo e fazendo barulho.

O caminho percorrido era assim:

Uma trilha que parecia sem fim. Daquelas que inevitavelmente a gente segue em frente, já sofrendo pela volta. O caminho era firme em algumas passadas mas, escorregadio em tantas outras. 

Em alguns momentos precisava usar minha velha capacidade de observação para parar por alguns segundos e pensar aonde seria mais sensato pisar. 

Não cheguei até o fim. 
Fiquei com medo da altura. 
Empaquei, igual mula. 

Mas parada lá no alto, faltando só um pouquinho pra acabar, ouvindo sem aparelho o barulho do vento, já tinha pego o espírito da coisa. 

A assinatura de Deus estava no caminho. Em todo ele. 

A visão imagino, teria sido espetacular poucos metros acima, mas a vista, até onde meu limite mental permitiu, trouxe esclarecimento suficiente: 

Ele sempre nos guia lá do alto, mas ontem, estive com Ele aqui embaixo durante todo o trajeto, caminhando lado a lado. Afinal, Cara, com todo o respeito: pensou que eu não ia reconhece-lo, com sua fantasia de cachorro?!



O texto acabaria bem aqui.

Porém, ao relê-lo achei engraçado que a descrição da trilha, descreve também o meu companheiro neste roteiro. Igualzinho. Sem tirar uma vírgula.
Um cara firme, mas às vezes escorregadio.
Um cara que me faz parar empacada, observando aonde pisar com sensatez.
Um cara que carrega uma história assinada por Deus.
Um cara que não permite, ainda, que eu o veja por inteiro.
Um cara que não usa fantasia ou máscaras, porém, permanece escondido atrás de si mesmo.

Não sei por quanto tempo ele permitirá compartilhar sua vida comigo, mas deixo aqui registrado que até onde consegui ver deste cara, (assim como o que consegui ver da trilha), foi suficiente para me fazer sentir gratidão. Ele trouxe tantos pequenos momentos de felicidade que formaram um novo capítulo da minha vida, por mais que ele já tenha decidido seguir seu próprio caminho.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Cuide bem do seu amor...

Há alguns dias atrás, em um nada raro momento de descoodernação motora, acabei derrubando meu celular no chão. Ao pegá-lo de volta, apesar da tela intacta, logo percebi a gravidade da situação: o coitado estava em seus últimos suspiros, funcionando apenas meia tela, totalmente hemiparésico.

Para piorar tudo, em uma outra situação eu já o  havia derrubado na privada, situação ao qual sobreviveu com sequelas, após dois meses de coma. Dessa vez não teve como se salvar: o pobrezinho havia de fato morrido! Eu teria de comprar outro, e assim o fiz, logo no dia seguinte.

Em posse do novo celular em mãos, prometi a mim mesma, cuidar como nunca havia cuidado de um celular:
 1 - Nada de colocá-lo na beirada de mesas, apenas ao centro!!!!
2 - Copos cheios próximos a ele, nem pensar!!!!
3 - Em hipótese alguma, colocar no chão, e muito menos carregar a bateria com o fio esticado longe da tomada.
4 - Terminamente proibido será andar com ele na rua para não dar sopa para marginais!!
5 - Fora de cogitação será levá-lo a shows e bares em geral, para novamente não ser surrupiado sorrateiramente.

 Após menos de quinze dias transcorridos da compra, atravessei a rua mandando audio para amigas e  cheguei em casa e o deixei carregando na ponta da mesa. Aonde os gatos quase não passam, e as pessoas quase não trombam.

Foi passando por ele, uma segunda vez  que percebi...

Percebi como tudo começa com promessas, com intenção de correção de erros, com zelo...e de repente, quando sentimos a sensação de posse do objeto, todo o cuidado inicial vai acabando, minando...vai tudo voltando ao comum.
Me dei conta disso após perceber que eu havia feito a mesma coisa com itens além do celular, aos quais eu também tinha expectativas de cuidados.

1 -  Expectativa: Comprar lindos sapatos novos e jurar jamais  colocar  qualquer outro em cima dele dentro da sapateira. 
Realidade: Usar os novos duas vezes e depois amontoá-lo apenas em qualquer lugar que coubesse.

2 - Expectativa: Comprar um óculos de grau novo, retirar do rosto a noite, e guardá-lo dentro da caixinha ao qual ele veio, além de levá-la dentro da bolsa, para momentos em que eu quisesse tirá-lo e precisasse guardá-lo em segurança!
Realidade: Perceber que o  óculos novo adquirido há duas semanas, foram limpados hoje mesmo com a camiseta que eu usava, e não havia  o menor sinal da caixinha na bolsa! Aliás, cadê essa bendita caixa?

3 - Expectativa: Comprar um violão e uma super capa protetora para prevenir quedas e fornecer muita proteção!
Realidade: Esquecer o violão no porta mala do carro durante três dias seguidos.

4 - Expectativa: Cuidar do aparelho auditivo adquirido há pouco tempo, pela benção e graça de Deus, como se fosse um filho!!!
Realidade: Esquecê-lo um dia, em cima da mesa, local ao qual os gatinhos adoram subir e derrubar coisas ao chão, além  de já ter perdido 3 baterias, por te-las tirado e não guardado no lugar correto.

5 - Expectativa: Comprar 10 brincos na 25 de março, e após a utilização, guardar ao final do dia, o brinco acoplado a sua tarrachinha  dentro da caixa de bijuterias.
Realidade: Dois meses após a compra de 10, sobram somente dois brincos inteiros na caixa.

6 - Expectativa: Ganhar flores!!!!!!!!!! Regá-las cantando três vezes ao dia!!!
Realidade:  Regar uma vez a noite, somente naquelas em que vou a cozinha beber água antes de dormir.

Estamos ainda no quarto mês do ano, e eu já descuidei de tantas coisas, que eu tinha de alguma forma e com alguma intensidade, me comprometido a cuidar bem. Achei engraçado o quanto a gente faz exatamente a mesma coisa nos relacionamentos pessoais.

Quantos cuidados temos no começo das relações, quantos mimos e dedicação para aos poucos, conforme a pessoa vai passando a fazer parte da nossa vida, e a gente vai se acostumando com a presença dela ao mesmo tempo em que os cuidados vão sendo deixados de lado... 
É como se deixasse de ser importante. É como se nada de mal pudesse acontecer as pessoas, ou às relações, pelo simples fato de alguém, de alguma forma, "pertencer" a você.

Se eu tivesse mais atenta aos detalhes, não teria deixado de fornecer o básico para a sobrevivência da minha florzinha: água, calor, sombra e carinho. Igualzinho o que as pessoas precisam!

Se eu tivesse tido um pouco mais de juízo, não teria deixado para resolver problemas " amanhã", afinal, nem sempre ele chega, e quando chega é tão incerto e descontrolado.

Se  eu tivesse tido um pouco mais de entendimento, não deixaria de sorrir, até chorar ou  ter dito como me sentia.

Se soubesse de tudo isso antes, não teria faltado com respeito e nem perdido oportunidades de dizer palavras bonitas e teria engolido mais as palavras amargas.

Teria compreendido mais, amado melhor e evoluído espiritualmente.

Teria cedido mais, amadurecido mais, tolerado mais, conversado mais, perdido menos tempo.

Se tivesse percebido que aquela pessoa era linda e especial a tempo, não teria tratado ela como trato os tantos outros... teria dado a atenção especial que lhe cabia, da mesma forma como deveria fazer com meus sapatos novos!

Se eu cuidasse das pessoas, com o mesmo zelo e afinco que agora tenho com meu aparelho auditivo, elas nunca teriam se quebrado. Se eu não tivesse esquecido minhas pessoas no meu porta malas, talvez estivessem vivas até hoje.

Se eu pudesse ter percebido tudo isso antes,
talvez este texto nem estaria aqui.

domingo, 22 de janeiro de 2017

Cadeiras

Estava comprando algumas coisas num shopping perto de casa e como já era hora do almoço, resolvi almoçar por lá, sozinha. Enquanto aguardava a minha senha aparecer vermelha no visor, sentada ali na praça de alimentação, não estava mexendo no celular. Estava observando, pra variar, a movimentação.

Havia muitas mães e filhos. Haviam apenas casais. Haviam alguns amigos apertados naqueles confortáveis bancos alemães. Havia uma família que me chamou a atenção, ao qual meus olhos se demoraram mais.

Era uma típica família de comercial de margarina: um papai, uma mamãe, uma criança e uma vovó.
Devo ter sorrido ao vê-los, pois aquela cena me aquecia o coração. Parecia algo que eu quase tive ou parecia algo que um dia gostaria de ter. Apesar de conflitivo e contraditório, observava a criança comendo um lanche do Mc Donalds, com uma mão e brincando com o brinde com a outra.

Os adultos comiam comida mais saudável, conversavam e riam. A vovó estava de frente para a criança, provavelmente se perguntava mentalmente qual a sobremesa mais gostosa para oferecer ao pequeno quando terminassem a refeição.

Mal sabiam o constrangimento que estava por vir:

Tudo muito rápido, a cadeira que a vovó estava cedeu e de repente a velhinha estava no chão, espatifada. Ela usava um vestido florido que subiu por entre as coxas, e ficou muito nervosa tentando arrumar de alguma forma, para que conseguisse cobrir novamente o que já havia sido descoberto.

Um homem que estava sentado ao lado da família, se encarregou de auxiliar a senhora a levantar, junto com a mãe. A criança também se levantou e levou as mãos a boca. Até soltou o brinquedo recém adquirido.

O pai tirava fotos da cadeira quebrada no celular, provavelmente para postar em alguma rede social o acontecido e criticar o shopping, ou qualquer coisa do tipo.

Posta em pé, a senhorinha estava amparada pela filha, queixando muito de dor nas costas. Após bater mais fotos, o pai recolheu as bandejas e jogou tudo fora, pegou a criança pela mão e foi chamar o segurança. Em breve, ele chegou, explicaram o acontecido e em poucos minutos foram todos embora.

Um acontecimento chato porém banal me trazia a mente que a vida é assim mesmo.

De repente você está, de repente não está mais.

Às vezes as coisas cedem.  No caso da  cadeira, ou por serem antigas, ou por serem mal construídas, ou por não ser ajustarem a você: não contei ainda, mas a vovó era gordinha.

Senti que meu casamento quebrou como fosse essa cadeira.

Era antigo, então parecia seguro. Algo em que se podia confiar. Algo que não precisava ajustar devido justamente ao seu longo tempo de vida. Afinal, se do jeito que estava funcionava, estava garantido, para que mexer? Até dava sinais de fraqueza, mas nunca imaginei que meu velho banco cederia. Pois, repetidamente: funcionou sempre.

O que eu não sabia é que apesar de funcional, ele era mal construído. Apesar de tudo aparentemente parecer bem, claramente dava sinais de enfraquecimento e fragilidade.

Um pé bambo. Um irritante pé bambo. Ele tinha sim. De fato era preciso constantemente encontramos um ponto de equilíbrio, mas qualquer movimentação mínima, fazia tudo estremecer novamente. Mas sabe? Como eu já disse... ele funcionava. 

Nunca havia deixado na mão. Acho que estávamos acostumado com essa falta de estabilidade. Manutenção dá trabalho né? Pra que consertar coisas que funcionam bem, com um jeitinho aqui e outro ali. Era o pensamento infantil arraigado àquele relacionamento. Por vezes ainda, por alguns segundos, quando paro pra pensar muito, ainda me sinto culpada de não ter visto tudo a tempo da ruína, mas logo passa, mas esse é o próximo parágrafo.

Aquela cadeira, na verdade, se ajustava bem a gente. Se por um lado, eu tenho minha parcela de culpa, ele igualmente tem também. E é por isso, sem me estender muito, que esse sentimento angustiante passa. Estávamos completamente moldados a uma cadeira existente antiga, enquanto devíamos fazer ela se moldar a nós com o passar do tempo. Fazíamos esforço para nos acomodarmos nela, e quando era desconfortável, simplesmente aguentávamos sem buscar consertá-la, ou torná-la melhor. 

Quissá, era preciso construir uma nova em folha, com muito cuidado e carinho, reconstruí-la. Ano após ano passados, crescemos e temos novas formas, não cabemos mais em cadeiras que costumávamos caber quando crianças. 

O mesmo acontece com o relacionamento: é preciso ajustá-lo e recriá-lo sempre que a perna começar a gastar. Sempre que o encosto parecer desconfortável. Sempre que o estofado comece a soltar a espuma. Sempre que necessário. A cadeira precisa se ajustar as novas necessidades da gente. Amadurecer com a gente.  

Mas quem conserta uma coisa que não parece estar quebrada, afinal?

A cadeira no shopping não emitiu sinais. A cadeira do casamento até emitiu sim, mas não se tinha olhos para percebê-los, e se hoje Bárbara, você tem, é somente porque amadureceu com a queda. Tudo acontece como tem que acontecer. Até a família da margarina não escapa de sustos e coisas não controláveis, percebe?

Um apito agudo me afastou dos pensamentos: minha senha brilhava no visor.
Está pronto!


Essa foto tirei em uma viagem, tirando sarro como se fosse uma rainha, e nesse momento me lembrei que de repente, mais que uma cadeira ajustada... que a gente seja capaz de erguer tronos em relacionamentos =)

domingo, 1 de janeiro de 2017

Noite Feliz

Data: 23 de dezembro de 2016: faltavam dois dias para mais um natal!

Aproveitava um intervalo entre um paciente e outro,  para fazer a mão, pensando no final de semana festivo e em como devia estar arrumada para a ocasião. Enquanto a moça lixava minhas unhas, eu dei uma contemplada no salão: lotado! Todas ali pensando o mesmo que eu.

Lembrei-me que se tratava do aniversário de Jesus. A festa mais importante  para a qual somos convidados durante o ano!

Passou - me pela cabeça uma imagem: o menino nascendo num presépio (pequenino), deitado em uma manjedoura afofada com palha, sem luz que não fossem a das estrelas no céu a noite... apenas seu pai José e sua mãe Maria ao lado, rodeados por alguns animais do estábulo, que testemunhavam seu nascimento. Tudo tão lindo e tão simples.



Por um minuto, tive ímpetos de sair correndo. 
Me senti culpada por ter me preocupado com algo banal para a ocasião do natal.

Havia me dado conta afinal, de que se a festa fosse com Jesus em carne e osso, ao tocar a campainha da casa dele, ele pouco se importaria com a roupa que eu estivesse usando, se eu havia feito um penteado bonito, levado presente ou pintado as unhas.
Ele iria simplesmente abrir a porta e agradecer a presença e ficaria feliz e orgulhoso porque eu estaria ali, ao seu lado. No caminho certo pelo qual ele quer que sigamos.

Aí me dei conta de outra coisa:

De que adianta usar uma roupa nova e linda, se o coração estiver corrompido por sentimentos perversos e feios?

De que adianta um penteado elegante se ele esconde, dentro da cabeça, pensamentos mesquinhos e egoístas?

De que adianta distribuir presentes aos entes queridos, se não estamos presentes no dia a dia dos nosso familiares e amigos quando precisam de nós?

De que adianta pintar as unhas de vermelho se as mãos não forem capazes de ofertar carinho  e vivem fechadas, dentro do bolso evitando a caridade?

De que adianta sapatos dourados ou prateados, se o caminho que os pés fazem, desviam daqueles trilhados pelas sandálias calçadas por Jesus? 

De que adianta a maquiagem brilhantemente produzida, se ela não melhora nos olhos, nossa capacidade de enxergar ao próximo, e se não melhora na boca, a capacidade de emitir apenas palavras edificantes e positivas nos diálogos?

De que adianta preparar uma mesa farta e bem decorada para a ceia, quando não se ajuda às famílias que não tem o que oferecer aos filhos todos os dias?

De que adianta o brinde com o espumante valioso, se passar o resto do ano com a garganta seca e voz ríspida?

Quando a manicure concluiu o serviço, eu estava ainda pensando em tudo isso internamente e em como colocaria em prática para ser digna de entrar na festa. Entendi que todos os dias a solicitação é feita: quando abrimos a janela e o sol brilha por ela, é Jesus nos entregando o convite para seu aniversário.
Não quero rasgar mais nenhum! Desafio aceito! Lá vamos nós para mais um ano de prática!

Feliz Natal!
Feliz aniversário Jesus! Sinta-se abraçado e muito, muito amado, mestre!

Que você, seu pai e meus anjos da guarda me fortaleçam para ser cada dia mais como você, mansa e pura de coração. O maior exemplo de amor que já passou por essa Terra!

terça-feira, 9 de agosto de 2016

Ah! Quem me dera...

Dias atrás eu fui a um sítio de uma amiga comemorar o aniversário de 06 anos da filha dela.  Claro que toda família estava por lá, e como sempre acontece, o meu lado magnético positivo para idosos logo me fez simpatizar com o avô da tal amiga.

O pai do meu pai já era falecido antes mesmo de eu nascer. O pai da minha mãe... bom, esse está entre nós, mas devido a uma série de questões, se a convivência for uma vez ao ano, em um almoço de natal, já é alguma coisa.

Eu não tenho e nem tive avô. Aliás, taí uma coisa que não deveria faltar a ninguém. A nenhuma criança e a nenhum adulto! Vô e Vó, pai e mãe, tinham quer ser eternos! É pedir muito? Tive avós, mas se foram, uma quando eu devia ter uns 9, 10 anos, e a outra quando eu tinha em torno de 20.

Avós são pessoas recheadas de ternura, afeto e carinho. Quando ninguém mais aguenta ou sabe o que fazer, como super heróis, eles tem uma solução. Eles transbordam paciência e exalam amor por todos os poros.

Seu Alberto.
Esse era o nome do avô da minha amiga.

Com sua bengala, cabelo branco nas laterais da cabeça e a careca no centro, me ganha fácil a simpatia. Cheio de histórias para contar, é uma lembrança viva do passado. Sabedoria personificada. 

Assim era ele, e assim, costumam ser todas as pessoas velhas. Assim costumam ser todos os avós. 

Assim sou eu querendo ouvir o que eles tem a dizer e o que aprenderam pela vida inteira.

Eu já havia topado com o sr. Alberto diversas outras vezes, em outros aniversários por aí, e cada vez que o via, sempre me encantava.

Não foi diferente dessa vez.  Ao me ver tocando violão, tomando um pouco de sol sentada à beira da piscina, de longe me gritou:

“- Ei! Vem tocar pra mim. Quero ouvir. Sente aqui ao meu lado”

Lá fui eu, recolhendo as cifras espalhadas, juntando tudo rapidamente e pensando com meus botões, se teria habilidade para tocar alguma música para ele.

Sorrindo cheguei ao lado dele, logo me explicando:

- Senhor Alberto, ainda não sei direito, estava justamente praticando porque fazem apenas uns oito meses que faço aula.

- Não importa minha filha. Então faz o seguinte, treina aqui do meu lado.

Assim fiz, e enquanto Sr. Alberto jogava dominó, eu praticava uma música que o professor havia me passado na última aula. Não demorou muito, ele me falou:

- Sabe, eu gostaria de ouvir uma música romântica. Dessas que eu gosto! Gosto muito de Roberto Carlos.

- Vou ver o que consigo fazer por você!

“Como vai você? Eu preciso saber da sua vida! Peça a alguém pra me contar sobre seu dia, anoiteceu e e preciso só saber: como vai você!”

Aos trancos e barrancos, com pausas maiores do que a música pede, com dedos em cordas erradas e em casas trocadas, uma melodia parecida começa a soar.

Seu Alberto fecha os olhos.

“- Você toca suave!”
- Mas tá mais ou menos Seu Alberto! Não sei direito, é muito difícil pra mim ainda.
- Sim sim, eu imagino. Mas continue!

“Como vai você, que já modificou a minha vida! Razão da minha paz, já esquecida... nem sei se gosto mais de mim ou de você!

A música acaba, e vou praticando outras coisas, até receber um novo pedido.

- Tem uma que gosto muito! Beijinho Doce!
- Essa é fácil!!

Que beijinho doce, que ela  tem! Depois que beijei ela, nunca mais amei ninguém.

- Você sabe que essa música é tudo mentira, né menina?
- hahahahahaha!!! Ta meio forçada né Seu Alberto?
-Mas é tão linda!!

Que beijinho doce, foi ela quem trouxe de longe pra mim. Se me abraça apertado suspiro dobrado, que amor sem fim!

- Vou te falar uma que você tem que aprender: Luar do Sertão
- Deixa eu pesquisar aqui..... Ahhh seu Alberto. Essa fica pra próxima, não sei nem como começa!
-Então essa você tem que aprender mesmo!
- Combinado.

E lá fiquei tocando outras velharias românticas que pensei que lhe agradariam.
Após um tempo, acabou a bateria do meu celular, então já não poderia mais acessar as cifras pelo aplicativo.

- Chega seu Alberto! Agora não sei mais nada, e os dedos já doem mesmo.
- Então vamos ali, tá vendo aquele pé de laranja lá na frente? A gente pega as laranjas e pode fazer um doce.

Ele me fala a receita passo a passo, até chegar alguém que o solicita e o leva para outro canto da festa.
Mais tarde chega o cara de novo:

- Agora quero jogar dominó com você!
-Opa! Vamos!!

Nisso,  Guilherme, um neto dele de 05 anos aparece sentando-se na mesa querendo jogar também.

Seu  Alberto me olha com uma cara do tipo, “putz! Já era!”. Mas continuamos jogando, e ele deixa o netinho ganhar, perdoando quando o moleque joga na nossa vez, e até quando ele coloca um quatro num canto que deveria ser cinco e me olha novamente “faz de conta que não vimos!” e eu pisco assumindo cumplicidade na vitória do pequeno Gui!

Na hora de ir embora, fui me despedir, e ele disse:

- Volta! Você vai voltar, não vai, outras vezes?
- Volto sim! Claro! E com a música que você me pediu aprendida... !